No dia 05 de novembro de 2015, o dique da Barragem de Fundão em Mariana/MG entrou em colapso e rompeu, causando um desastre socioambiental sem precedentes na história do Brasil até aquele momento. A consequência dessa tragédia, ainda em desenvolvimento, foi a transformação da dinâmica natural do Doce e de seus afluentes e na vida de aproximadamente de 1.6 milhões de pessoas nos municípios situados desde a jusante da barragem destruída em Minas Gerais até a foz do Rio Doce e litoral do Espírito Santo. O desastre ambiental deixou como legado um rastro de destruição, contaminação e mortes.
As medidas de reparação de perdas e danos são processos que desafiam a compreensão das famílias atingidas, seja por conta da complexidade jurídico-burocrática, o demorado tempo de resposta à supressão de seus direitos, bem como por demandar que os atingidos no pós-desastre repensem seus projetos de futuro. Para tanto, os atingidos e atingidas, que sofrem graves violações de direito, não devem ser vistos apenas como receptores de medidas de reparação, mas sim devem ser sujeitos ativos na criação, operação e avaliação das metodologias e procedimentos ligados recuperação dos danos que sofreram.
Em um contexto marcado por violações do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e a própria dignidade humana, o compartilhamento do poder decisório entre causadores do desastre e famílias atingidas configura o único caminho para a compensação satisfatória e reparação plena dos danos sofridos por estas pessoas.
A participação cidadã e o controle social como formas de compartilhamento de poder são vias para a motivação e o entusiasmo das famílias na luta por seus direitos. Neste sentido, para o desenvolvimento de um processo participativo de resolução dos danos causados pelo desastre de Fundão, são criadas as Comissões dos Atingidos de Rio Doce, Santa Cruz do Escalvado e Chopotó, uma forma de ação coletiva que representa todos os atingidos deste território. A iniciativa facilitou a socialização das demandas, dos debates e a disseminação do diálogo coletivo entre eles, com o poder público e as empresas causadoras do desastre.
Com objetivo ampliarem suas capacidades de luta pela reparação os atingidos e suas comissões, em fevereiro de 2018, escolhem o Centro Alternativo de Formação Popular Rosa Fortini para prestar assessoria multidisciplinar independente.
A escolha da assessoria envolveu várias reuniões de articulação com a presença de diferentes comunidades de Rio Doce, Santa Cruz do Escalvado e Chopotó. A audiência pública na qual os atingidos definiram e legitimaram o Centro Alternativo de Formação Popular Rosa Fortini como seu Projeto de Assessoria Técnica Independente (ATI) foi registrado a presença de aproximadamente 1.400 pessoas. A assembleia contou também como a presença de membros do Ministério Público Federal e Ministério Público Estadual.
O PROJETO DE ASSESSORIA TÉCNICA INDEPENDENTE AOS ATINGIDOS DOS MUNICÍPIOS DE SANTA CRUZ DO ESCALVADO, RIO DOCE E PONTE NOVA - COMUNIDADE CHOPOTÓ.
O Projeto de Assessoria Técnica Independente aos Atingidos dos Municípios de Santa Cruz do Escalvado, Rio Doce e Ponte Nova - Comunidade Chopotó, foi aprovado pela Fundação Renova e pelos Ministério Público Federal e Estadual em agosto de 2018. O objetivo do projeto é possibilitar a efetiva participação e informação em todos os processos de decisão e cumprimento da reparação de perdas e danos vivenciados pelas famílias ou pessoas atingidas pelo rompimento da barragem de Fundão, envolvendo as localidades de Rio Doce, Santa Cruz do Escalvado e Comunidade de Chopotó – Município de Ponte Nova, levando em consideração as especificidades locais. Bem como, a revisão dos Programas de Reparação Socioambiental, socioeconômica, conforme Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC) firmado com as empresas responsáveis pela tragédia, as diversas entidades civis e Poder Público.
São beneficiários das ações da ATI a população atingida dos municípios de Santa Cruz do Escalvado, Rio Doce e Ponte Nova - Comunidade Chopotó, dentre as quais identificam-se diferentes categorias sociais, tais como: produtores rurais, trabalhadores rurais, trabalhadores autônomos, assalariados, comerciantes, povos e comunidades tradicionais (pescadores, garimpeiros e ribeirinhos).
Inicialmente o projeto foi proposto para trabalhar com cerca de 650 famílias residentes nas áreas urbanas e rurais, contudo, após 1 ano de execução registra-se que aproximadamente 2.000 famílias foram atendidas pela assessoria - cabendo esclarecer, que Assessoria Técnica Independe não promove busca ativa por atingidos.
Na avaliação interna da ATI estima-se a possibilidade de que o número de famílias atendidas aumente ainda mais ao longo do projeto. O indicativo desta possível ampliação de usuários é o processo de empoderamento e autoreconhecimento que a atuação da ATI suscita. Situação a partir qual pessoas e comunidades passam a se perceberem atingidas pelo desastre. Nestes termos, a compreensão sobre ser atingido extrapola as definições utilizadas pela Fundação Renova (que se fundamenta na espacialidade) e propicia que as pessoas tenham subsídios para se expressar em voz e vez, de forma a fortalecer sua cidadania.