Dia da Consciência Negra: como o racismo ambiental aprofunda desigualdades

No Brasil, pessoas pretas, pardas e indígenas são as que mais enfrentam falta de recursos, moradia adequada, saúde e direitos básicos. Isso não é coincidência, é resultado direto de séculos de desigualdade racial estrutural, que segue empurrando nossos povos para as margens e para as áreas mais vulneráveis. É a lógica do país que foi erguido pelo trabalho negro e indígena, mas insiste em negar dignidade para quem o construiu.

Essa mesma desigualdade determina quem mais sofre com os impactos das mudanças climáticas. O Censo de 2022, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), escancara: comunidades negras e indígenas vivem com mais frequência em regiões expostas a enchentes, deslizamentos, falta de água, calor extremo e outros eventos climáticos que só pioram com a crise ambiental.

Esse fenômeno tem nome e não é novo: racismo ambiental. Ele acontece quando injustiças raciais se juntam com injustiças ambientais. Ou seja: quando determinados grupos (quase sempre os mais pobres, quase sempre pretos, pardos, indígenas, ribeirinhos, quilombolas) são empurrados para áreas de maior risco, recebem menos proteção do Estado e acabam sendo os primeiros a sofrer com desastres, degradação ambiental ou com a implantação de grandes empreendimentos, como hidrelétricas, mineração, monoculturas e obras que ignoram o território e quem vive nele.

Quando olhamos para Minas, o racismo ambiental fica ainda mais evidente

O rompimento da barragem da Samarco, em Mariana, em 2015, é um exemplo que as comunidades atingidas não deixam e não deixarão esquecer. Ao longo do rio Doce, grande parte da população é preta ou parda. E são essas mesmas populações que até hoje carregam as marcas desse desastre: perda de território, de renda, de cultura, de modos de vida tradicionais, modos de vida que giravam em torno do rio, do quintal, da pesca, da roça, das relações comunitárias.

O que ficou nítido ali, e segue explícito dez anos depois, é que o dano ambiental não chega igual. Ele pesa mais sobre quem já tinha menos. Sobre quem sempre foi invisibilizado.  

E o cenário pode piorar

Mesmo com tudo isso exposto, em agosto de 2025 o Congresso aprovou o chamado PL da Devastação, um ataque direto ao meio ambiente e às populações tradicionais. O projeto facilita o licenciamento ambiental, enfraquece a fiscalização e abre caminho para que grandes empreendimentos avancem com a palavra das próprias empresas. É a velha história: quando interessa ao capital, o cuidado vira obstáculo; quando explode a tragédia, são sempre as mesmas comunidades que pagam a conta.

Na prática, esse projeto escancara e aprofunda o racismo ambiental. Porque quem fica na linha de frente, de novo, são os povos pretos, pardos, indígenas, ribeirinhos e rurais, gente que já vive entre o abandono e o risco, mas segue resistindo.

Por que falar sobre isso no Dia da Consciência Negra?

Porque consciência negra é consciência de território, de memória, de luta coletiva. Porque entender o racismo ambiental é o primeiro passo para enfrentá-lo. Porque ninguém deveria sofrer mais só por causa da cor da pele ou do lugar onde mora, e isso continua acontecendo todos os dias.

E, principalmente, porque as comunidades atingidas precisam ser protagonistas das soluções, com direitos garantidos, consulta prévia, proteção efetiva e políticas públicas que respeitem suas histórias e seus territórios. O Brasil é signatário da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que assegura exatamente isso. Mas, na prática, esse compromisso segue distante de se tornar realidade.

O movimento negro organizado, os territórios quilombolas, as comunidades tradicionais, ribeirinhas e indígenas seguem levantando essa bandeira: justiça ambiental é justiça racial. E sem enfrentar o racismo ambiental, não existe futuro possível, nem para o clima, nem para o país, nem para o povo negro.

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Editorial Centro Rosa Fortini

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